Reconhecimento
Dia das Mães... e de lutas
Neste 8 de maio, o Diário Popular traz a palavra de Raquel Guilherme, 40, e Rosângela Mendes, 49; dois relatos da vida real
O pedido é de socorro. Mas a cena não envolve criminalidade, tampouco passa por alguma urgência de saúde. O grito é de fome. Era 1º de maio, Dia do Trabalhador, e não havia alimento para dar para os dois filhos e o sobrinho. "A barriga grita e não tem como fazer. Isso aí não é vida". O desabafo é da moradora do Getúlio Vargas, Raquel Macedo Guilherme, 40. E é com as palavras dela, que não raro tem deixado de comer para garantir a refeição de Alisson, 13, Jonathan, 11, e Gabriel, 9, que o Diário Popular homenageia - neste 8 de maio - todas as mães que lutam, dia após dia, para preservar a prole. São atos que se transformam em eu te amo, ainda que não expressamente.
"A gente nunca ficou nesse extremo. Tá muito precário. No feriado, eu e o Maicon [o companheiro] tava chorando porque a gente não tinha nada pra dar pra eles", conta. E nesses dias assim, que a fome dói, eles já sabem a melhor estratégia: deitar e tentar dormir. "Aí, quando a gente acorda já é outro dia, pra começar de novo". É hora de ir para as ruas garimpar o sustento com os recicláveis, tão disputados desde as primeiras horas da manhã. De domingo a domingo. E se a maior arrecadação for de papelões, o valor que cai no bolso é ainda mais baixo. "Esses dias, vendemos 72 quilos e ganhamos R$ 23,00".
Até o ano passado, o casal vivia da prestação de serviços: limpeza de pátios e corte de grama. A pandemia já causava impacto na movimentação. Foi quando o maquinário da família foi furtado. Sem outra opção para garantir a renda, Raquel e Maicon Fontes, 25, passaram a trabalhar com recicláveis. "Fazemos muita força e ganhamos pouco. Seria muito bom se tivéssemos uma carrocinha", afirma. Melhor ainda se tivessem acesso a uma roçadeira - complementa.
E quando pensa nesses tempos de dificuldades, faz questão de enaltecer as três formas com que a alimentação também tem chegado aos guris: doações da vizinha, que tem uma padaria em frente; a merenda escolar e os lanches distribuídos no projeto Jovem Atleta. "A gente faz o melhor que pode. Trabalhar nunca foi problema pra nós, mas a gente tem ido de um lado pro outro pra sobreviver. Só queríamos poder descansar", resume. "Deitar e dormir um dia inteiro".
Ajude!
* Para contato com a Raquel Guilherme: (53) 98426-4014
* Para falar com o projeto Jovem Atleta: (53) 99192-0441
- Atualmente, o Jovem Atleta atende em torno de cem famílias, mas não há estoque de cestas básicas. À medida que chegam as doações, os alimentos são imediatamente distribuídos.
- Itens como arroz, feijão, massa, farinha, leite, bolacha, óleo e café são os principais.
- Para doações em dinheiro: Pix é o mesmo celular 53991920441 - no nome do coordenador Carlos Alberto Teixeira de Oliveira.
Uma cesta emergencial custa cerca de R$ 90,00.
- A sede fica na rua Três, 270, no Getúlio Vargas.
- O atendimento ocorre de segunda a sexta, das 14h30min às 18h.
Para além de amor, compromisso social
A mensagem está expressa na camiseta vermelha: Nós por nós. É o que Rosângela Vieira Mendes, 49, tem procurado ressaltar ao pequeno Arthur, de nove anos. E para propagar o ensinamento, a mãe solo não se preocupa em dar discursos. As lições vêm com a prática mesmo. Esforço diário e olhar coletivo. Às 7h15min, a municipária já está na estrada, rumo à Unidade Básica de Saúde (UBS) de Cerrito Alegre, 3º distrito de Pelotas. E lá se vão 13 anos dessa rotina em direção à colônia, em uma trajetória profissional prestes a completar 24 anos.
São mecanismos para tentar engrossar o salário, que tem o valor de R$ 698,97 como ponto de partida para a base de cálculo das vantagens conquistadas. "Durante a pandemia, quando me dei conta de tudo que estávamos passando, apesar de eu ser concursada e ter um salário indigno de R$ 1.646,00, com todo esse tempo de carreira e mesmo com o Difícil Acesso, fiquei imaginando o que muitas outras mães não estariam enfrentando", explica a servidora pública. Estava lançada a provocação.
Em 1º de maio de 2021, então, Rosângela fazia parte da equipe que levou a primeira ação da Nós por nós para as ruas. De lá para cá, 35 famílias da Estrada do Engenho têm recebido cestas básicas todos os meses. Os mutirões para entregar marmitas a pessoas em situação rua, aos sábados, também saíram do papel. A coleta de caixinhas de leite têm sido outra prioridade e o motivo é nobre: os resíduos tornam-se placas para o isolamento térmico de residências em situação de precariedade.
E é mais um momento em que a vó Vilma, 69, fica de prontidão: aproveita o conhecimento como costureira, coloca a máquina industrial à disposição e surgem as placas de tetra PAK. E o que tudo isso tem a ver com maternidade? "Ser mãe, não é só aquela romantização. É lindo. É maravilhoso. Mas, acima de tudo, é um grande compromisso. Uma grande responsabilidade formar um cidadão para a sociedade. Um ser que irá se comportar no mundo", enfatiza Rosângela.
E o Arthur, o Tui, adora estar com a mãe Rô nas ações sociais. Ao ser questionado sobre o que mais admira nela, ele não pestaneja: "Que ela ajuda as pessoas". São aprendizados através do exemplo. E a lição reverbera: Nós por nós, para além do projeto.
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